Elaborar códigos de ética se tornou o novo “must” das organizações. É necessária uma apreciação crítica sobre o que eles de fato representam e possibilitam nas relações com a comunidade. O que efetivamente está por trás desses códigos de ética? É preciso compreendê-los melhor para que possam se transformar em efetivos instrumentos de uma nova ética corporativa na sociedade moderna.

As organizações têm adotado prolificamente códigos de ética voluntários, cada vez mais sofisticados, a que pretensamente se autoimpõem, no intuito de se precatarem contra quaisquer legislações adicionais que possam surgir no ambiente em que atuam.

Esses códigos não têm objetivamente qualquer efeito jurídico limitante ou restritivo, e servem, o mais das vezes, para definir regras mínimas de conduta cujo respeito seja suficiente para liberar as organizações de eventuais responsabilidades ou minimizar a repercussão de práticas inadequadas.

Em geral, os códigos de ética fazem muito pouca alusão, como demonstram estudos realizados pela OIT desde 1998, à liberdade de associação dos empregados; à proibição explícita de jornadas de trabalho estafantes; à homogeneização dos níveis de remuneração; à proibição do trabalho infantil; à não discriminação à mulher e aos idosos, aos portadores de deficiência, às diferenças étnicas ou raciais; aos compromissos de proteção à saúde e à segurança no exercício das funções laborais.

Ademais, costumam ser bastante seletivos, para não dizer tímidos, na obediência e na incorporação das últimas conquistas e dos mais recentes avanços das normas internacionais de proteção do trabalho. Quando, por exemplo, condenam o trabalho infantil, não apoiam a liberdade de associação ou se mostram arredios à ação sindical. Normalmente, os textos desses códigos não configuram um corpo de políticas homogêneas que traduzam a verdadeira identidade da organização, que faça a distinção de sua marca doutrinária, que defina o seu DNA ideológico. Em verdade, os códigos de ética usualmente pecam por vícios fundamentais, como, por exemplo:

  1. Não têm a capacidade de substituir ou de se sobrepor às legislações em vigor.
  2. São iniciativas eminentemente privadas, portanto, estranhas às competências legais do poder público.
  3. Sua aplicação é aleatória, dependendo absolutamente da vontade dos dirigentes corporativos.
  4. Não se submetem a um verdadeiro e legítimo controle externo, independente e imparcial, que judiciosamente acompanhe o seu efetivo cumprimento.
  5. As suas recomendações e exigências se situam praticamente sempre abaixo das normas internacionais já existentes, às quais, pressupostamente, as organizações estariam obrigadas a obedecer, tendo ou não códigos de ética.
  6. Sem reciprocidade ou transparência, os códigos de ética   supostamente também são aplicados aos fornecedores, aos subcontratados e aos terceirizados, mas, em verdade, geralmente se constituem em construções teóricas, quando não academicistas ou publicitárias, de limitado valor prático.
  7. São muito mal avaliados corporativamente por auditorias internas, sempre complacentes, e ávidos pela obtenção da plena aprovação dos conselhos de administração, das assembleias dos acionistas, e do aplauso não crítico da imprensa e da sociedade em que atuam. E claro: particularmente do silêncio obsequioso da comunidade acadêmica especializada.

Assim, os códigos de ética devem ser percebidos objetivamente como de fato o são: no máximo estratégias válidas de construção corporativa de imagem institucional, referências conceptuais de marketing ou de comunicação social, contratos psicológicos internos de compromissos, ou mesmo a definição de políticas de autoproteção para o enfrentamento de eventuais questões a que a organização possa vir a se envolver no desempenho de suas atividades.

Eis aí a sua verdadeira faceta: apenas a explicitação da ética do interesse particular condensada numa ferramenta de gestão corporativa, em que, muita vez, a organização pretende se  apresentar como a exemplificação da virtude na justificação e na sustentação das ações judiciais nos fóruns locais ou internacionais a que possam vir a serem envolvidas por ações promovidas por integrantes das comunidades em que atuam.