“Estamos diante de um modelo que prioriza a jogatina em detrimento de medidas que visam controlar o vício principalmente dos cidadãos mais vulneráveis”, alerta o presidente do Conselho Regional de Administração do Rio de Janeiro (CRA-RJ), administrador Wagner Siqueira, em entrevista que analisa as polêmicas envolvendo a regulamentação dos jogos de apostas on-line.

 

O presidente do CRA-RJ ainda destaca o perigo da expansão descontrolada do setor de apostas no Brasil, a partir da regulamentação iniciada no governo Temer e que continua, até hoje, sem um debate público profundo ou mesmo com a ausência de políticas preventivas adequadas.

 

– O que precisa ser mais bem discutido em relação à Lei 14.790 de 2024, do governo Lula?

WS – Essa lei consolidou um sistema de tributação que permite às empresas ficarem com até 88% do faturamento bruto de apostas, destinando apenas 12% para áreas sociais como saúde e educação.

 

– Esse percentual para a área social deveria ser maior?

WS – Sim. Essa baixa contrapartida social num setor que movimenta bilhões de reais, deixa claro que estamos diante de um modelo que prioriza a jogatina em detrimento de medida que visam controlar o vício principalmente dos cidadãos mais vulneráveis.

 

– O Brasil seguiu o modelo de países com mais tradição em apostas, como a Inglaterra?

WS – A comparação com o Reino Unido deixa muito claro como o Brasil está falhando na regulamentação das apostas. Lá existem limites claros para o endividamento dos apostadores e garantias reais de que as empresas cumpram suas obrigações sociais. Aqui, o mercado cresceu sem mecanismos de controle eficazes. Temos mais de 250 empresas que permitem apostas em eventos triviais, o que reflete o descontrole no setor.

 

– O governo está fazendo alguma coisa para controlar o setor de apostas?

WS – Muito pouco. A solução de oferecer tratamento psicológico para viciados em apostas é insuficiente. Não podemos apenas abordar o sintoma e deixar de lado as causas estruturais que favorecem o crescimento desenfreado da atividade no país.

 

– Como deveria ser encaminhada a discussão para chegarem a uma solução satisfatória?

WS – No Brasil, esse debate sempre girou em torno de bingos e cassinos, impedidos de atuar por desconfianças relacionadas com lavagem de dinheiro, entre outros motivos. Mas as apostas on-line, que deveriam ser reguladas com muito cuidado, foram aprovadas sem o menor rigor por parte das autoridades.

 

– Está correta a tributação sobre a apostas no Brasil?

WS – É inadequada. A alíquota de 15% na tributação para os apostadores é insuficiente para garantir uma redistribuição justa dos recursos. E ainda deveria existir um controle feito por auditorias independentes.

 

– O Sr. defende, então, uma revisão na lei que regulamenta as bets no Brasil?

WS – O modelo aprovado favorece a expansão das bets sem levar em conta os aspectos sociais e econômicos, principalmente em relação às consequências que podem atingir a famílias mais vulneráveis. E se não forem implementadas regras mais duras e auditorias rigorosas, o impacto social será devastador.