A data é 9 de setembro — Dia do Administrador — 56 anos de existência legal da profissão. Uma data marcante, um convite à reflexão, ao balanço, à revisão, ao debate de rumos e de perspectivas. Nada se constrói, inclusive uma profissão, sem uma atitude séria e profunda de repensar constantemente a sua natureza, a sua fisionomia, o seu papel, a sua contribuição ao País. Por isso, mais do que louvações vazias e discursos ribombantes, esta data estimula os administradores brasileiros à discussão do futuro desta profissão que acreditamos ser a profissão do futuro — mas que só o será se souber se afirmar poderosamente no presente.
Historicamente, a profissão nasceu no bojo das transformações provocadas pela Revolução de 30, em que se tentava esgotar o velho estado dos bacharéis a serviço de um poder controlado pelas elites agrárias. A industrialização e a modernização da máquina estatal e dos serviços públicos pediam especialistas nas técnicas de gestão das organizações. Surgiu então o Dasp e, com ele, a função de técnico de administração. Surgindo como necessidade, a profissão deu uma contribuição relevante ao processo então em curso. Mas, como todo processo social, o impulso acabou se esgotando por absorção e entrando no impasse com a profissão limitada quase que só à administração pública e às instituições conexas paraestatais.
A saída verdadeira seria a colocação das técnicas de administração a serviço de um desenvolvimento econômico realmente nacional, sobretudo a indústria, que começava a crescer. E foi o que aconteceu: o impulso seguinte que a profissão encontrou foi o boom da entrada de capital estrangeiro no Brasil, na segunda metade da década de 50, e a consequente necessidade de formação de administradores para tais empresas e empreendimentos. O fenômeno se aprofundou sobremaneira com a fase do milagre, ainda no regime militar, quando se generalizaram as faculdades de administração no País, atendendo aos reclamos do surto de crescimento, mas centrando na formação de especialistas voltados apenas para a realidade das multinacionais e das grandes empresas, inclusive estatais.
A profunda crise econômica produzida pelos graves erros da política predominante nos anos das badaladas décadas perdidas, devastando com a economia, o tecido social e as situações estabelecidas, veio esgotar também essa fase, colocando a profissão em um novo impasse.
Toda a crise, no entanto, constitui uma oportunidade de crescimento. Foi um excelente momento de a profissão se repensar e repensar todo o seu papel. Foi mais uma virada de mudança e de afirmação profissional.
Não podemos agora continuar sendo a profissão de um futuro que nunca chega. Para que nossa profissão justifique sua existência e assegure o seu futuro, precisa tornar-se a profissão que contribua para transformar a realidade dos tempos presentes.
E o presente é o profundo impasse que o País enfrenta produzido ainda pela crise global de 2008, agravada agora pela pandemia do coronavírus. O Brasil vive uma crise total que coloca em nível de exposição dramática a fragilidade pungente de nossa capacidade de gestão dos recursos de infraestrutura em geral, pois, afinal, há muito não crescemos consistentemente.
Esta situação limitante de crise, que atravanca o processo de alavancagem do País, está a exigir soluções concretas e saídas próprias para todos os setores da vida nacional, inclusive, e principalmente, dos administradores. É nesse quadro que se jogam os destinos do administrador: só nos afirmaremos se formos capazes de responder aos desafios que a realidade presente nos coloca e a contribuição que ela nos exige.
Nenhum País hoje desenvolvido prescindiu dessa virada de gestão de suas organizações para atingir um estágio superior: ninguém consegue saltar o gap sem desenvolver modelos próprios de administração, voltados para sua realidade específica e trilhando caminhos originais. Foi assim com os Estados Unidos de Ford e Taylor, a Inglaterra de Owen, a Rússia de Stakhanov, a França de Fayol e, mais recentemente, o Japão do Kaizen e dos CCQs e, mais forte ainda, o socialismo de mercado da China. É assim também na cópia de gestão dos países asiáticos emergentes. E assim também terá que ser com o Brasil, que não pode ficar apenas copiando o que dá certo no exterior porque está formulado para a realidade própria de outros Países, que não é a nossa.
“É a hora de elaborar um modelo de administração brasileiro”.
A crise atual, obrigando a nação e a nossa profissão a repensarem seus caminhos, é o momento de ouro para os administradores: é a hora de produzirmos o nosso Ford, Taylor, Owen, Fourier, Stakhanov, Fayol e as nossas teorias brasileiras de gestão, teorias b, de Brasil. É a hora de elaborar um modelo de administração brasileiro, macunaímico, verde-amarelo, zedasilvesco, que responda aos nossos problemas e encontre as nossas saídas. É a hora de reconhecer e sistematizar a cultura organizacional própria do Brasil. É a hora de encontrar os caminhos específicos que podem tornar o futuro presente. Este é o desafio que se coloca para os administradores no dia de hoje.
“Nenhuma profissão se afirma se não cumprir seu papel social”.
É da resposta a esse desafio que dependem os destinos de nossa profissão. Nenhuma profissão se afirma se não cumprir seu papel social. E papel social é algo concreto, que se define a cada momento do processo de desenvolvimento histórico. Hoje, o exercício do papel social do Administrador encontra seu lado decisivo na contribuição da profissão à formulação de um novo modelo de gestão para o País concreto, que, mais do que nunca, demanda por uma administração pública e privada competente, ágil e dinâmica.
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