É uma doce ilusão julgar que mudanças voluntaristas produzidas por empresários progressistas sejam capazes por si só de transformar o sistema econômico, garantindo-lhe algum sentido de espírito publico e de bem comum.
As mudanças incrementais produzidas nos estamentos burocráticos das macro corporações modernas não são suficientes para humanizá-las. É necessário que o processo de mudança seja sistêmico e globalizante, abrangendo os conceitos, as estruturas e a lógica que permeiam a atual ordem econômica mundial.
As mudanças incrementais restritas em nível organizacional strictu sensu são fadadas, cedo ou tarde, ao fracasso.
É comum as organizações anunciarem políticas de valorização de recursos humanos ao mesmo tempo em que promovem drásticos cortes de sua força laboral, sempre em nome dos imperativos da racionalidade de gestão, do combate ao desperdício e do controle de custos.
Buscam surfar na onda das políticas e das práticas da proteção ambiental na medida em que essas lhes propiciem melhor imagem pública e aumento de sua capacidade de venda, sob a ostentação do indefectível selo verde de qualidade. Apregoam as maravilhas de seus programas de distribuição de lucros aos empregados, mas cortam salários, benefícios, direitos e garantias trabalhistas e previdenciárias.
Apresentam-se como empresas-cidadãs, sempre ávidas dos privilégios fiscais e tributários que julgam merecer. Os bancos brasileiros, por exemplo, têm belíssimos programas de responsabilidade social concomitante à aplicação dos juros mais escorchantes do mundo.
É preciso, assim, desconstruir as ilusões que embalam hoje em dia muitos profissionais bem intencionados que militam nesses programas no mundo das corporações em todo o mundo.
O mais das vezes, por trás das novas crenças da responsabilidade social, da participação acionária, das empresas-cidadãs, por trás de muitas dessas práticas que se pretendem nobres, puras, éticas e transcendentes, subsistem interesses escusos, escolhas inconscientes, verdades mais profundas ainda não percebidas e, quando não, inconfessáveis.
Essas práticas poderão ser bem mais conseqüentes e contributivas à melhoria do mundo do trabalho se aprendermos a desconfiar das evidências, das idéias prontas e aparentemente generosas, para tentar perceber, em sua essência, o que há por trás de cada uma delas.
É claro que não podemos pensar que todas as organizações que se dedicam aos programas de responsabilidade social não os façam de forma legítima e lícita. Mas é preciso estar sempre alerta sobre todos para podermos separar o joio do trigo. E, só assim, fazer avançar a verdadeira democracia cidadã.
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