Por Wagner Siqueira, consultor de organização, Diretor-Geral da UCAdm – Universidade Corporativa do Administrador RJ e Conselheiro Federal RJ, licenciado junto ao CFA. Texto extraído da REVISTA DE SER EDUCACIONAL (editora responsável Ana Shirley).

 

É preciso ensinar aos nossos alunos as novas competências necessárias à 4ª Revolução Industrial (RT). É preciso – na imensidão do Brasil – já que o ensino de gestão, em suas mais diversas facetas, é um grande curso de graduação, além disso, também qualificar os nossos professores, pois só assim atingiremos uma massa crítica de transmissão de conhecimentos capaz de produzir a mudança de trazer o país à contemporaneidade dos tempos presentes.

 

Mais do que nunca, os imperativos da inovação nos levam à necessidade dramática de “reconceptualização” e de transformação nos métodos de ensino dos Cursos de Administração. Não serão as novas Diretrizes Curriculares, recém aprovadas, que irradiarão a mudança necessária. Elas apenas reeditam a repetição do mesmo, com uma nova roupagem, talvez com uma fatiota mais elegante, mas, no mundo digital, ainda pensam analogicamente. Essencialmente, não mudam de frequência, atuam no mesmo comprimento de onda, em relação aos velhos conceitos do ensino de gestão.

 

Ferramentas hightechs – tecnologia de ponta – precisam se integrar ao conhecimento aplicado de disciplinas tradicionais, como lógica e filosofia, antropologia e ciências sociais, matemática e história, ciência política e economia, contabilidade, sociologia e estatística. Não como disciplinas isoladas que aqui ou ali se interpenetram, mas como um todo integrado e orgânico de conhecimentos, aplicados simultaneamente à resolução de questões organizacionais. Associar a aplicação de ciências exatas e humanas à valorização de competências emocionais, humanizar a organização, colocar a ciência, a técnica e a arte da gestão a serviço do homem. A boa gestão deve estar bem fecundada na cosmovisão – na weltanschaung – da realidade da organização, de seus processos e de sua cultura, propiciada pela integração das tecnologias digitais às ciências do comportamento humano.

 

Até que ponto estamos nós – professores de administração – dispostos a enfrentar essas mudanças, muitas vezes tão difíceis e dolorosas? Este é um imperativo categórico, portanto, fundamental a ser aplicado. Ao constatar a capacidade e a velocidade de os professores de Administração se reinventarem nesta pandemia do coronavírus, encho-me de convicção e de confiança de que conseguirão vencer o desafio: sair da sala de aula presencial tradicional para aula remota com tanta criatividade e competência demonstra o domínio de condições objetivas para vencê-lo.

 

A Educação 4.0, em especial em gestão, não funciona isoladamente. As ferramentas hightechs devem estar aliadas às metodologias de ensino-aprendizagem que agreguem todas as disciplinas, num só campo de interesse e de interconexão, como um todo integrado. Não pode ser diferente na sociedade do conhecimento, em que o cerne do processo de aprendizagem permanente é vital à própria vida.

 

Não se pode confundir tecnologia com deixar para o sistema automatizado de aprendizagem o papel de ensinar o aluno. As tecnologias devem estar a serviço da educação de qualidade. Deve permitir diagnosticar o aprendizado do aluno e complementar o trabalho do professor. Garantir que o aluno tenha ideia melhor, mais compreensiva, dos caminhos a seguir, com itinerários e trilhas de aprendizagens customizadas e personalizadas a cada aluno de per si. A Educação também precisa ser customizada, sair da produção em massa do saber! Nem todos nascem para serem empreendedores, nem para serem vocacionados a patrões ou a empregados. Cada um é único e singular, e deve ser educado nesta perspectiva.

 

Os processos pedagógicos devem ser amparados pela tecnologia e não serem substituídos por ela. As atividades de ensino-aprendizagem ganham, assim, maiores possibilidades de meter a mão na massa, de aprender fazendo, de fazer as devidas conexões teoria e prática, já que se dispõe de um infinito espaço de aprendizagens por meio das facilidades da utilização digital. Fazer teoria e prática se retroalimentarem em processo de causação circular. Aprender a pensar e a interpretar a sua realidade, ou seja, como quase o lugar comum, aprender a aprender, aprender a desaprender e aprender a pensar de forma autóctone. Deixar de ser treinado em sala de aula como mero aplicador de técnicas da moda, que logo serão superadas.

 

A tecnologia avança à velocidade da luz, mas a mentalidade educacional avança à velocidade do carro de boi. Vivemos e trabalhamos na sociedade do futuro, mas continuamos a usar valores, práticas e procedimentos de ensino-aprendizagens do passado. Definitivamente, as metodologias ativas são muito importantes e válidas, mas não são a panaceia para resolver todas as necessidades educacionais do aluno. Mas, enquanto isso, as Instituições de Ensino Superior (IES) mantêm rígidos os departamentos de ciências exatas, o de ciências humanas e o de ciências biológicas, como se o mundo e a vida fossem separados e distintos nessas caixinhas isoladas. Diante de tal constatação, devem reformular e reforçar as estruturas de seus cursos para alinhá-los às imposições da Indústria 4.0. Fazer a fusão do mundo digital, físico, biológico e humano. Esta visão vale tanto para quem se destina a ser empreendedor, empregador, empregado ou rentista da bolsa, pouco importa o que for. Vale, sobretudo, para ser cidadão contemporâneo deste novo mundo no Século XXI.

 

O ensino de Administração deve ser marcadamente impregnado do mundo real. Fazer o aluno transcender a sua inequívoca competência no uso do smartphone para fazê-lo compreender e aplicar tecnologias hightechs por meio dele no desenvolvimento de cenários organizacionais, na resolução de problemas, na gestão de conflitos, na tomada de decisão, na identificação de novas oportunidades de ação. Pode ser até através de interações produzidas por concepções e montagens de chatbots hipotéticos ou reais em salas de aula ou laboratórios. Uma coisinha simples, mas com enorme potencial de transformação educacional e de motivação para a aprendizagem. O ensino de administração precisa estudar em sala de aula as implicações e os resultados do uso da Inteligência Artificial (IA) em áreas como planejamento de negócios; processos organizacionais; lógica empresarial; monitoramento, avaliação e crítica de desempenho de resultados; perfil e características da cultura; estratégias de desenvolvimento empresarial; marketing; vendas; finanças, logística; segurança patrimonial; recrutamento, seleção e desenvolvimento de pessoas; economia circular; gestão sustentável;  e assim por diante.

 

Em que as tecnologias hightechs não se aplicam ao desempenho das organizações? Como podem estar, então, fora do cotidiano de nossas aulas e cursos de gestão? Pode ser até que usualmente sejam até citadas, mas efetivamente são muito pouco aplicadas. Quando muito são apenas referências ilustrativas de estudos de casos de sucesso. É preciso pedagogicamente fazer os nossos alunos vivenciá-las em meta-verso, replicando educacionalmente a realidade em dispositivos digitais, em que os alunos e professores discutam e interajam entre si na prática, na teoria, na análise, no diagnóstico e nas alternativas de solução de problemas de gestão, das relações pessoais, interpessoais, em equipe, interequipes e organizacionais de relações de trabalho.

 

A chegada próxima do 5G no Brasil não só vai escancarar as possibilidades objetivas de utilização de recursos tecnológicos no ensino de Administração, por democratizar o acesso ao conjunto de todas as IESs, independente de seu porte, como também vai evidenciar às escâncaras a enorme defasagem das práticas pedagógicas que adotamos em todo o Brasil, excluindo-se as poucas e raras exceções atípicas de praxe bem conhecidas.

 

A 4ª. RI só terá sucesso se tiver em sua essência, no seu DNA, algo já plenamente consagrado como necessário: uma boa gestão! E esta só se fará com bons gestores formados e forjados em aplicação simultânea de tecnologias hightechs, junto à aplicação de ciências sociais, ambas integradamente focadas na realidade da organização em atuação no universo da sociedade.